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DATA DA RECEPÇÃO: Fevereiro, 2018 | DATA DA ACEITAÇÃO: Maio, 2018
Resumo
A presente comunicação faz uma caracterização do Processo de Ensino e Aprendizagem
não Universitário com ênfase nos seus desafios e perspectivas. Analisa este processo a
partir da interpretação sistêmica que decorre dos pressupostos legais da Educação e
Ensino em Angola. Como método usa a revisão bibliográfica e a interpretação e
fundamenta a caracterização do referido processo como variável básica para a análise da
qualidade do Sistema de Educação e Ensino em Angola, idealizado com base nos
princípios da legalidade, da integridade, da laicidade, da universalidade, da
democraticidade, da gratuitidade, da obrigatoriedade, da intervenção do Estado, da
qualidade de serviços, da educação e promoção dos valores morais, cívicos e patrióticos.
Tem como objectivo reflectir sobre os aspectos que o caracterizam e que interferem na
sua qualidade. Apresenta a missão do processo integrada ao Sistema em que todos os
agentes educativos participam da sua funcionalidade.
Palavas-Chave: Processo, Ensino, Aprendizagem, Sistema.
Caracterização do processo de ensino e aprendizagem não universitário angolano. Desafios e
perspectivas
Characterization of the angolan non-university teaching and learning process. Challenges and
perspectives
Caracterización del proceso de enseñanza y aprendizaje no universitario en angola retos y perspectivas
Caractérisation du processus d'enseignement et d'apprentissage non universitaire en angola. Défis et
perspectives
ABEL JOSÉ DA SILVA
0000-0002-2910-1281
Doutor. Instituto Superior de Ciências de Educação. Huambo. Angola
adasilva00@gmail.com
IRENE JAMBA INAKULO MOISÉS
0000-0001-8298-9286
Doutora. Instituto Superior de Ciências de Educação. Huambo. Angola
ireneinakulo.moises@gmail.com
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Abstract
This scientific paper characterizes the Non-University Teaching and Learning Process
with an emphasis on its challenges and perspectives. It analyzes this process from the
systemic interpretation that arises from the legal presuppositions of Education and
Teaching in Angola. As method uses the literature review and the interpretation and
founded the characterization of this process as basic variable for the analysis of the quality
of the system of Education and Teaching in Angola. Idealized on the basis of the
principles of legality, integrity, secularity, universality, democracy, gratuitousness,
obligation, compulsion, State intervention, quality of services, education and promotion
of moral, civic and patriotic values. It aims to reflect on the aspects that characterize and
that interfere in its quality. Has the mission of the process integrated into the System in
which all educational agents participate in its functionality.
Key-words: Process, Teaching, Learning, System.
Resumen
Este documento caracteriza el Proceso de Enseñanza y Aprendizaje No Universitario
haciendo hincapié en sus retos y perspectivas. Analiza este proceso desde la interpretación
sistémica que se deriva de los supuestos legales de la Educación y la Enseñanza en
Angola. Como método utiliza la revisión e interpretación de la literatura y fundamenta la
caracterización de ese proceso como variable básica para el análisis de la calidad del
Sistema de Educación y Enseñanza en Angola, concebido a partir de los principios de
legalidad, integridad, laicidad, universalidad, democracia, gratuidad, obligatoriedad,
intervención del Estado, calidad de los servicios, educación y promoción de valores
morales, cívicos y patrióticos. Pretende reflexionar sobre los aspectos que la caracterizan
y que interfieren en su calidad. Presenta la misión del proceso integrado al Sistema en el
que participan todos los agentes educativos en su funcionalidad.
Palabras clave: Proceso, Enseñanza, Aprendizaje, Sistema.
Résumé
Ce document caractérise le processus d'enseignement et d'apprentissage non universitaire
en mettant l'accent sur ses défis et ses perspectives. Il analyse ce processus à partir de
l'interprétation systémique qui découle des hypothèses juridiques de l'éducation et de
l'enseignement en Angola. Comme méthode, elle utilise la revue et l'interprétation de la
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littérature et fonde la caractérisation de ce processus comme variable de base pour
l'analyse de la qualité du Système d'Education et d'Enseignement en Angola, conçu sur la
base des principes de galité, d'intégrité, de laïcité, d'universalité, de démocratie, de
gratuité, d'obligation, d'intervention de l'Etat, de qualité des services, d'éducation et de
promotion des valeurs morales, civiques et patriotiques. Elle vise à réfléchir aux aspects
qui la caractérisent et qui nuisent à sa qualité. Il présente la mission du processus intégré
au Système dans lequel tous les agents éducatifs participent à sa fonctionnalité.
Mots clés: Processus, Enseignement, Apprentissage, Système.
Introdução
O Processo de Ensino e Aprendizagem não Universitário (PEANU) é uma importante
variável para a análise do Sistema de Educação e Ensino em Angola (SEEA), sistema
perspectivado com base nos “princípios da legalidade, da integridade, da laicidade, da
universalidade, da democraticidade, da gratuitidade, da obrigatoriedade, da intervenção
do Estado, da qualidade de serviços, da educação e promoção dos valores morais, cívicos
e patrióticos” (Lei n.
o
17/16, art. 5.º)
1
.
A caracterização do PEANU pressupõe assumir um posicionamento holístico que analise
o mesmo como um processo não isolado do todo, porque o SEEA é estruturalmente
unitário e a sua realização na situação específica da análise tem influência no
funcionamento da totalidade (princípio da integridade, art. 7.º e art. 17º).
Os desafios e perspectivas, como outra dimensão importante derivada do processo de
parametrização do assunto objecto de análise, justificam-se a partir da consideração dos
princípios da universalidade, democraticidade, gratuitidade, obrigatoriedade, intervenção
do Estado, qualidade de serviços e da educação e promoção dos valores morais, pois que,
se a Lei tipifica o que idealmente é o correcto, a necessidade de confrontar com a
realidade, à luz da pesquisa bibliográfica, é inadiável para o alinhamento do agir
educativo com os princípios legais.
A partir destes princípios infere-se que a Educação e o Ensino são não apenas um direito,
mas também um dever que se deve realizar com a qualidade requerida para que a
construção de uma nova sociedade assente na democracia esclarecida seja possível. Para
isso, à Escola, através do Processo de Ensino e Aprendizagem (PEA) em todos os níveis
1
Lei de Bases do Sistema de Educação e Ensino, que estabelece os princípios e bases do Sistema de
Educação e Ensino em Angola, de 7 de Outubro de 2016. Esta Lei revoga a Lei 13/01 de 31 de Dezembro
de 2001.
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de ensino e, especialmente, nos não universitários, impende a tarefa de formar
personalidades capazes de influenciar com o seu saber e suas qualidades, o curso da
história concreta do seu contexto. Deste modo, o Processo tem de ser significativo
2
. Para
que o processo seja significativo é necessário caracterizá-lo com a finalidade de que se
conheçam não os seus pontos fortes, mas também os fracos, aspecto que se aborda
seguidamente.
Por isso, o objectivo deste trabalho consiste em reflectir sobre os aspectos do SEEA que
o caracterizam e que interferem na qualidade do PEANU.
1. Estrutura do Seea: Ponto de partida para a caracterização do Peanu
A caracterização do PEANU é um processo que permite um conhecimento “ad intra” da
realidade educativa que se projecta como ponto de partida para o seu melhoramento (Cfr.
Silva, 2016). Por isso, a análise estrutural do SEEA baseada nas proposições da Lei 17/16,
e fundamentada pela revisão bibliográfica com procedimento de leitura crítico-contextual
é uma tarefa basilar para esta caracterização.
A caracterização do Sistema Educativo numa perspectiva histórico-evolutiva e funcional,
de acordo com Ngaba ( 2012) e Liberato (2014), permite concluir que existem avanços e
retrocessos no processo educativo angolano, que em termos de política educativa
condicionaram a sua evolução positiva bem como a sua afirmação no cenário
internacional e até mesmo regional
3
.
A partir desta ideia geral sobre o estado do SEEA, que de modo especial se realiza por
meio do PEANU, é possível compreender que, estruturalmente, está bem concebido, se
se analisam todos os factores intencionais de entrada e saída de um nível de ensino para
2
O PEANU é significativo quando assegure o cumprimento da sua finalidade, tal como se institui no art.
25º da Lei 17/16, referente aos Objectivos Gerais do Subsistema do Ensino Geral. Desta significatividade
resulta, em consequência, a eficácia do Sistema.
3
Este momento crítico do SEEA é também hoje reconhecido oficialmente pelo Ministério da Educação
do País, na voz da sua titular no encerramento da Semana Nacional sobre Educação em Angola realizada
em Luanda. Por isso, para a caracterização da situação actual do Sistema Educativo, e do PEANU
especificamente, é critério dos autores deste trabalho que, os problemas fracturantes que colocam em
causa a qualidade do Sistema não podem ser analisados unilateralmente, sob pena de se incorrer num
reducionismo indevido, pois estão em causa múltiplas variáveis que chocam com diversos princípios e
disposições legais em que assenta o Sistema: infraestruturas precárias, insuficiência dos materiais e
meios didácticos, factos que se agravam ainda mais com a falta de preparação adequada dos
professores de tal modo que possam responder aos desafios do Sistema idealizados pela Reforma
Educativa. Essa visão geral estrutural e conjuntural pode reflectir-se e explicar-se melhor por meio do
seguinte exemplo: em relação à indisciplina na aula, espaço privilegiado em que se desenvolve o PEA,
Estrela (1983) citada por Lopes (2005) identificou um conjunto de variáveis que vão desde o próprio
aluno, passando pelo professor, pela instituição escolar até à própria sociedade. Estes são dados
suficientes para pensar na qualidade educativa como multideterminada.
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outro. Entretanto, o aspecto funcional real fica aquém do desejado, se se avaliam, com
visão crítico-académica, os resultados do processo e os discursos oficiais que asseguram
a Política do Sistema Educativo.
Contrariamente à 1.ª República, (Cfr. Ngaba, 2012) que não se fez reger por um
documento base, tanto a 2.ª como a 3.ª Repúblicas de Angola têm como fundamento a
Lei de Bases do SEEA, que estabelece a criação de condições mais adequadas para a
aplicação das políticas públicas e dos programas nacionais, com o objectivo de continuar
a assegurar o desenvolvimento humano, com base numa educação e aprendizagem ao
longo da vida para todos os indivíduos, que permita assegurar o aumento dos níveis de
qualidade de ensino.
Considerando a análise da estrutura do Sistema estabelecido pela Lei 17/16, conclui-se
que as principais alterações à antiga Lei relacionam-se, entre outras, com a gratuitidade e
obrigatoriedade do ensino, que passa a compreender as classes da Iniciação, do Ensino
Primário e do Primeiro Ciclo do Ensino Secundário, bem como a nomenclatura das
instituições.
Nesta vertente, assume-se que o Subsistema de Ensino Geral é o fundamento do SEEA
(Lei n.
o
17/16, art. 24.º), que visa, de acordo com o artigo em referência, assegurar uma
formação integral, harmoniosa e sólida, necessária para uma boa inserção no mercado de
trabalho e na sociedade, bem como para o acesso aos níveis de ensino subsequentes.
Como se pode apreciar, existe uma relação de determinação entre o processo de ensino e
aprendizagem que se realiza no Subsistema do Ensino Geral e o trabalho, bem como com
a Sociedade e com os níveis de ensino posteriores, o que significa o reconhecimento da
importância deste nível, que deve permitir a aquisição de ferramentas fundamentais para
a compreensão da vida e do mundo. Entre os seus objectivos, de acordo com Ngaba (2012,
p. 158) constam os do desenvolvimento “dos conhecimentos e as capacidades que
favoreçam uma auto-formação; educar para a cidadania”. A educação, vista a partir da
óptica deste nível de ensino, é um factor de integração social.
Por isso, o questionamento da qualidade do PEANU é no fundo o questionamento da
qualidade do Sistema em si, uma vez que, estudando Políticas Educativas em Angola
(1975-2005), o autor antes referenciado, e alinhado com Liberato, afirma:
“Em termos gerais, fica a ideia de estarmos perante um processo evolutivo que em
períodos diferentes se foi deparando com os mesmos problemas, e optando pelas mesmas
soluções”. No entanto, de acordo com o mesmo autor, “quase quatro décadas depois das
primeiras mudanças “significativas” no sector da educação, décadas essas caraterizadas
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por sucessivos estudos e mudanças o país (…) carece de soluções radicais que possam
corrigir, de uma vez por todas, os factores relacionados com o baixo coeficiente do
sistema angolano”. (Ngaba, 2012, p. 173).
De acordo com a ideia anterior, a questão da qualidade de ensino em Angola não deve
ser vista como uma questão da responsabilidade exclusiva de um ou de outro nível de
ensino, mas como uma questão transversal do SEEA, considerando entre outros
princípios gerais, o da integralidade estatuído no artigo 7
o
da Lei 17/16. Por isso a análise
desta questão implica um posicionamento multifactorial.
Com base nessa posição, o Sistema possui potencialidades capazes de proporcionar um
PEA motivador que permita a construção das aprendizagens dos alunos e que transforme
o saber em saber fazer e em saber ser na base de uma visão axiológica, pois, atendendo à
complexidade da acção educativa, a UNESCO, no Relatório DELORS (2003, p. 11),
sustenta que para concretizar a sua meta, a educação deve organizar-se em quatro tipos
fundamentais de aprendizagens que, ao longo da vida do indivíduo, serão os pilares do
conhecimento:
Aprender a conhecer, isto é, adquirir os instrumentos para a
compeensão; aprender a fazer, de modo a ser capaz de agir
criativamente no próprio ambiente; aprender a viver juntos, de modo a
participar e a colaborar com os outros em todas as actividades humanas;
aprender a ser, isto é, um progresso essencial que deriva dos três
precedentes.
Para tornar este sonho real é necessário que o processo seja significativo e em si mesmo
motivador, formando os professores de acordo com as necessidades da realidade
objectiva. Trata-se de prover os recursos necessários a um processo que desafie os limites
da situação actual, pois, se o professor é indispensável, não é menos verdade que os
recursos educativos também o sejam (Lei 17/16, art. 97º).
4
Tendo em conta os pressupostos legais da República de Angola (Constituição da
República e Lei 17/16) e os pilares da educação propostos pela UNESCO, considera-se
que o ideal educativo está devidamente delineado. Contudo, é necessário que, de acordo
4
No artigo 97º, a Lei 17/16 define recursos educativos como os meios que contribuem para o
desenvolvimento do SEEA, tais como: a) Guias e programas pedagógicos; b) Manuais escolares; C)
Meios técnicos e tecnológicos de ensino; d) Bibliotecas; e) Equipamentos; f) Laboratórios; g) Oficinas;
h) Instalações e material desportivo e cultural; i) Campos de ensaios, treinamento e experimentação; j)
Auditórios e salas especializadas.
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com Nanni (2005, p.81) citado por Fernando (2010, p. 17) no “âmbito educativo, o fim
último o horizonte para o qual deve tender toda a acção educativa não deve fazer com
que os fins intermédios que o tornam possível e factível sejam esquecidos”. Daí a
relação entre fins, meios e procedimentos educativos.
A distinção entre fins últimos da educação, meios e procedimentos educativos é
fundamental porque, de acordo com Fernando (2010, p. 18),
Impele à procura e a determinar os recursos, o tempo, as modalidades e as estratégias para
a realização do objectivo educativo que se pretende e permite, de certo modo, não
esquecer que se não se fizer a diferença entre ideal e real, entre fim último e limite da
acção humana, entre o horizonte e o limite concreto das coisas e da existência, entre o
itinerário projectado e a complexidade do percurso e da vida das pessoas, corre-se o risco
de se ser desumano e de cair no perfeccionismo ou de se desencorajar, cansar e por fim,
de se sentir insatisfeito com aquilo que se faz.
Em consequência, nos nossos dias, a questão do discurso pedagógico sobre a finalidade
da educação para caracterizar o PEANU não é fácil, porque a educação é caracterizada
hoje por certa crise, pela necessidade de inovação, e pelo pluralismo de ideias, de valor e
de cultura do momento histórico actual (Cfr. Fernando, 2010; Ngaba, 2012; Liberato,
2014).
Na continuidade da análise sobre a finalidade da educação para caracterizar o PEANU,
os autores concordam com Fernando (2010, p. 19) ao distinguir dois tipos de tendências
educativas:
1. A tendência redutora, que “procura ver a aprendizagem em função das necessidades
da economia que, com as suas solicitações, convida a rever os conteúdos do ensino e sua
organização. Esta é a linha ou corrente mais seguida nos nossos dias”.
2. A tendência aberta, que “procura integrar no conceito de aprendizagem outros
elementos significativos, mais ligados às dimensões psicológicas, sociais e culturais das
experiências do indivíduo enquanto protagonista da aprendizagem”.
Para os autores, embora a primeira tendência seja a mais seguida actualmente, a segunda
parece melhor corresponder à dignidade do homem responsável, porque de acordo com a
Lei 17/16 (art. 15.º), o SEEA deve promover não o cultivo da intelectualidade, mas
também dos valores morais cívicos e patrióticos.
Assim, a primeira reduz a finalidade da escola à instrução e a segunda supera esta visão
sustentando que a finalidade primária da actividade pedagógica escolar é a de educar,
sem, contudo deixar de parte a sua função instrutiva. Neste sentido, a finalidade da
educação, como instituição social, deve coincidir com a finalidade da escola enquanto
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instituição formal e socialmente mandatada para educar, isto é, para possibilitar o
desenvolvimento permanente da qualidade da pessoa humana com dignidade, e
integridade.
2. Desafios e Perspectivas da Educação
Nas páginas anteriores ficou clara a ideia de que os resultados qualitativos do SEEA,
fundamentalmente relacionados com o PEANU, são e devem ser processo-produto de um
funcionamento integral do Sistema. Por isso, o maior desafio da educação em Angola
hoje é o de vencer a contradição existente em que são atribuídas culpas isoladas ou ao
aluno que não estuda, ou ao professor que não está preparado e não motiva, ou às matérias
que não são atractivas e adaptadas à realidade profissional e do contexto de vida dos
alunos, ou aos pais que não acompanham suficientemente os filhos ou ainda ao próprio
Sistema Educativo de maneira geral.
De acordo com a ideia anterior e tendo em conta a revisão bibliográfica realizada
5
, os
autores consideram que os desafios para a melhoria das falhas devem ser enfrentados de
forma sistêmica, porque cada uma das variáveis antes mencionadas é importante para o
funcionamento normal ou não do PEA não apenas no nível referenciado, mas em todos
os níveis, em atenção aos princípios de integridade do Sistema e da obrigatoriedade e
qualidade dos serviços educativos. Isto pressupõe uma política educativa ajustada à
realidade, que incentive a formação contínua dos professores e garanta os meios
materiais indispensáveis ao processo.
Trata-se de construir uma verdadeira comunidade educativa em que todos os agentes
educativos como a família, a escola e a comunidade na sua dimensão mais alargada
participem. Por isso, é necessário repensar a educação para que seja possível a construção
de um país novo, como afirmara José Eduardo dos Santos (2008) nos seguintes termos:
“um novo país está a nascer e, com ele, há-de florescer também um cidadão novo”.
Quando?
5
Em Ofíco de Aluno e Sentido do Trabalho Escolar, Perrenoud (1995) denuncia uma dupla evidência: por
um lado, há alunos que não aprendem e, por outro, professores que não formam, porque ambos se
contentam em exercer manualmente os ócios do ofício enquanto a cabeça está ausente. Na mesma
linha, Grilo (2002) entende que na “Na sociedade do conhecimento, hoje, aprende-se e ensina-se em
circunstâncias e contextos muito diversos, embora por vezes, se ensine, mas não se aprenda, como
ocorre, por exemplo, em algumas das escolas. Mas, partindo do princípio de que, quando se ensina, há
sempre alguém que aprende, o ensino (…) é um mecanismo muito importante e uma peça fundamental
desta sociedade” (p. 121).
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Considerando a perspectiva temporal, como resposta, os autores acreditam que isso se
realizará à medida que a educação se assuma antes de tudo como uma condição de
verdadeira cidadania e não de mera transmissão de receitas importadas do exterior e
enxertadas no nosso contexto; quando todos os agentes educativos tiverem presente que
o educar é, na verdade, um verbo “que exige uma acção com atitude transformadora”
(Pereira e Silva, 2008, p. 24). É neste sentido que José Eduardo dos Santos, na sua
alocução à Nação, referia-se ao papel dos pais, dos professores e de todos os actores
sociais como verdadeiros agentes educativos da juventude. Trata-se do desafio de
construir uma verdadeira sociedade educativa.
Na construção dessa sociedade educativa, a formação contínua dos professores para o
SEEA e, sobretudo para o PEANU, deve ser entendida como uma consequência de uma
formação inicial que seja adequada às necessidades reais da sociedade para a qual se
educa. Isso implica que os professores devem ser formados com base nos desafios da
nova República (Ngaba, 2012).
A formação inicial que serve de base para a formação contínua de professores, de acordo
com a Lei 17/16 é assegurada pelo Subsistema de Formação de Professores, que está
estruturado em: Ensino Secundário Pedagógico e Ensino Superior Pedagógico. O
primeiro constitui o “processo através do qual os indivíduos adquirem e desenvolvem
conhecimentos, hábitos, habilidades, capacidades e atitudes que os capacite para o
exercício da profissão docente na Educação Pré-escolar, no Ensino Primário e no I Ciclo
do Ensino Secundário Regular, de adultos e na Educação Especial e mediante critérios, o
acesso ao Ensino Superior Pedagógico”. (Art. 46).
Por outro lado e, de acordo com a mesma Lei, um dos fundamentos do SEEA, o “Ensino
Superior Pedagógico é um conjunto de processos, desenvolvidos em Instituições de
Ensino Superior, vocacionados à formação de professores e demais agentes de educação,
habilitando-os para o exercício da actividade docente e de apoio à docência em todos os
níveis e subsistemas de ensino”. (Art. 49).
Em correspondência com os estes dois artigos da Lei 17/16, compreende-se a relação
intrínseca entre o Subsistema de Formação de Professores e os diferentes veis de ensino
do SEEA.
A educação em Angola, vista na óptica dos seus fundamentos legais, constitui-se assim
numa “forma de poder porque a educabilidade é um poder-ser humano, mediado pela
educação como poder sobre o ser humano, que decide sobre o dever-ser humano. É um
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poder ser, porque o ser humano é um ser biologicamente aberto à criação de uma segunda
natureza”. (Monteiro, 2004, p. 12).
De acordo com o autor referenciado com antecedência, todas as formas de poder do ser
humano sobre o outro suscitam a questão da sua legitimidade. Esta questão é, no fundo,
a do fundamento e controlo do poder que o professor exerce, através dos conteúdos e
formas da comunicação que realiza ante o aluno. Assim sendo:
A “legitimidade pedagógica é de natureza social, porque ser
profissional da educação implica um mandato da sociedade, através do
Estado, que regula o exercício da função. É também de natureza
individual, na medida em que a competência pessoal tem um efeito de
auto-legitimação junto dos educandos. Mas tem de ser problematizada
com mais radicalidade, porque a educação é, afinal, uma forma de poder
do homem sobre o homem”. (Monteiro, 2004, p. 12).
Daí que, se a educação é uma forma de poder, é necessário que se exerça tal poder na
justa medida, tendo como princípio e limite a Lei que estabelece entre outros aspectos
importantes não só a formação inicial, mas também a contínua dos professores para que
respondam às necessidades da sociedade angolana.
Portanto, a análise da qualidade da educação como um fenómeno multideterminado, que
possibilita caracterizar o Sistema, justifica que a formação contínua de professores,
variável importante para esta caracterização, não deve ser vista como um simples
adereço, mas sim como parte importante de uma cultura institucionalmente legal, onde
a articulação entre as instituições de Ensino Superior (pedagógicas ou não) e as do
ensino geral, seja dialecticamente um facto.
CONCLUSÃO
A caracterização do PEANU é um processo que permite um conhecimento da realidade
educativa que se projecta como ponto de partida para o seu melhoramento, que tem como
fundamento a interpretação da Lei e a revisão bibliográfica com procedimento de leitura
crítico-contextual.
A revisão bibliográfica assente numa perspectiva histórico-evolutiva e funcional permite
concluir que existem avanços e retrocessos no processo educativo angolano, que em
termos de política educativa condicionaram sua evolução positiva bem como sua
afirmação no cenário internacional e até mesmo regional.
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Esta constatação impõe desafios a vencer na perspectiva da construção de uma sociedade
educativa em que cada agente participe, reconhecendo a necessidade contínua da
formação dos professores para o PEANU como fundamento do SEEA.
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